Academia Paraibana de Letras


A criança perguntou à professora com qual cor deveria pintar o céu. Nas suas miúdas mãos, havia lápis de diversas cores; tantos amarelos que poderiam expandir o Sol em todo o firmamento. Sem resposta, sem hesitação, ela iniciou a pintura, começando por onde sabia; deixando algumas coisas pela metade para completá-las depois, mas já definindo o que queria pintar. Diferentemente dos adultos, as crianças não hesitam, riscam qualquer coisa ao seu gosto e por prazer, até em parede recém-pintada ou em carro novo, para depois esclarecer o que pretendeu pintar, dando uma ou várias explicações…

Mas, nos contornos prontos, já tinha colocado na terra: árvores, flores, rios, bichos e, no sopé da montanha, uma casinha; tudo como se fosse o “dia da criação”. E voltou a insistir: – Com qual cor eu pinto o céu? A professora, cansada, com muitos alunos a orientar, respondeu-lhe o óbvio: – Com as cores do céu. As crianças de hoje imaginam coisas inimagináveis: misericordiamente, um céu sem cor, sem porta, como a imensa passagem fosse para entrada de todos. Também, na simplicidade, elas são mestras das definições circulares, repetindo o sujeito no predicado : o elefante é um elefante; uma girafa é uma girafa; não lhes agradando respostas redundantes ou complexas sobre o como ou o porquê das coisas. Espantou a professora, dizendo que o céu talvez não tivesse cor; e que o céu estaria tão longe, assim não se veria sua cor. Ou, na confusa visão, o céu só teria uma cor, mas não sabia qual cor seria. A professora lhe apontou: – Olhe aqui as nuvens, são brancas. Então, a criança justificou: – As nuvens são brancas porque ainda não foram pintadas. Prosseguia ela o desenho: por trás de uma verdejante montanha, havia um arco-íris, sortido de cores…

Existem muitos desenhos em branco que saem da escola para casa e voltam de casa para escola não terminados, tendo os pais aos filhos, depois de uma árdua jornada de trabalho, apenas as maiores obrigações: carinho e sustento. E a casa, sem como ensinar esses “deveres de casa”, talvez também por falta de escolaridade dos pais, espera ansiosamente mais “escolas de tempo integral”, de “ensino em dois turnos”, para se evitarem reprovações, baixo índice no rendimento escolar, evasões , e sobretudo para que as crianças sofram exigências acima do que podem e tenham suas tarefas feitas por elas, na escola, com tempo para encontrarem ou não a cor com a qual pintará o seu céu. Alegra-nos o Governador Ricardo Coutinho com a notícia de que duplicará as escolas com “ensino integral” na Paraíba; sem essa providência, as crianças não aprenderão a fazer seus “deveres de casa”, não farão chover nos tempos de seca e terão nuvens vazias em céus incolores…

Damião Ramos Cavalcanti

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