Nunca deixou que se instalasse a rotina na sua profissão, cada dia continha positivas diferenças dos vivenciados quotidianos. Mas, de tanto curar os outros, chegou o dia em que, cansado, ele se foi, deixando-nos um exemplo de homem bom, afável, culto e empreendedor. Isso tudo se somava ao seu ser ético, de conduta simples, discreta e espontânea, conduzindo-se assim mesmo quando não era observado, jamais deu importância aos avisos “você está sendo filmado”; tampouco percebia que estava sendo visto pelos céus… Altruísta, a vida de médico possibilita a profissão como Marco Aurélio a exercia: tratava nossos corações com a inteireza do seu coração.
Na Academia Paraibana de Medicina, o seu então Presidente Ricardo Maia rendeu homenagem ao médico Vicente Rocco, que se dedicou, de corpo e alma, à Clínica Geral, à Ginecologia e à medicina popular, sendo como frisou um verdadeiro “missionário do seu juramento”, junto às camadas mais pobres. A seguir, passou-me a palavra para ressaltar a motivação daquela homenagem. Não se esquece um médico, que pratica fielmente a finalidade da sua profissão: Curar os outros, com tal objetivo acima de todos os outros interesses e vantagens. Por causa disso, Vicente Rocco não era esquecido, ao contrário, reconhecido e muito homenageado, como exemplo de altruísmo. Minha fala, nesse sentido, emocionou Marco Aurélio, vindo ao meu encontro e elogiando-me, com sentimento: “Você, Damião, realçou, com maestria, a mais completa definição do que é ser médico, belo e denso discurso, só assim se modificará o que se pensa da medicina”. Agradeci-lhe no ato: Você é prototípico do que eu disse.
Em conversas anteriores, conheci seu modo de pensar, manifestou-se um culto humanista e de conhecimento holístico, conceito que se enriquece nas pessoas bondosas, desde a época de Hipócrates, médico grego, filósofo, entre os anos de 460 a 377 antes de Cristo. A virtude atravessa séculos. Tais qualidades e razões enobrecem, enriquecem e proporcionam excelência ao conhecimento científico do médico. Marco Aurélio Barros passou seus 85 anos de vida, por onde houvesse cultura e aprendizagem de como curar e cuidar da saúde dos outros. Nasceu em Campina Grande; formou-se na UFBA; estagiou no Departamento de Cardiologia da Universidade de Minnesota, nos USA e no Instituto Nacional de Cardiologia do México. Com esse aprendizado, dessas escolas e das experiências da vida, criou o Programa de Residência Médica do Hospital Universitário da UFPB; foi idealizador e editor da Revista do CCS da UFPB, e também criou o Núcleo de Medicina Tropical desta Universidade, onde ele não se deixava prender dentro daquele Campus; batia, extramuros, todos os bairros da cidade, na práxis da sua teoria de que a medicina é a arte do diálogo, “sem pressa”, entre o médico e o paciente; e que isso é o melhor exame para se descobrirem os sintomas causais e até as “doenças assintomáticas”.
Contudo, encontrava tempo para se inteirar dos progressos na área da tecnologia médica e, minuciosamente, explicar as melhorias de um stent para outro, até se transformarem perfeitamente em parede arterial. O que lhe preocupava era o preço dessas melhorias à saúde do pobre. Nisso e noutros sentidos, foi um indispensável “samaritano”, como se chamava a casa que construiu e a que tanto serviu. Para si o que cogitava? Li, neste Jornal, que andavam à procura de plasma para aliviar-lhe as dores e o sofrimento do covid-19. Mas é assim, a vida é diferente, mas, no fim, iguala-se à morte… E de tanto curar os outros, chegou o dia em que, cansado, não curou a si mesmo e se foi…
Damião Ramos Cavalcanti