– Olhe ali, disse-me o motorista, duas viaturas, oito soldados, cercando uma mulher pelada. Era quarta-feira, ao claro do dia, na primeira esquina da Avenida Professora Maria Sales; nem sandálias ela usava. Os soldados, simetricamente, a dois metros e meio da retida, impediam que ela caminhasse na calçada. Observou Genival, se, no aeroporto, mulher vestida só pode ser revistada por uma policial, imagine, ali, agentes masculinos, em via pública, agarrando uma mulher nua. Nem olhar ousavam, faziam de conta que não viam… Ao contrário, homens, à distância, não tiravam a vista dos seus detalhes, exclamando: “Até que é boa”. E senhoras de certa idade censuravam: “É o fim do mundo”; as mais instruídas diagnosticavam: “Ela surtou”; as menos instruídas recriminavam: “Ela pirou”…
Parecia a Praia de Tambaba se transferindo para a de Tambaú. Mas, o corpo nu nada tinha de banhista; às vésperas do carnaval, usava fantasia um pouco mais radical do que as sambistas dos desfiles momescos. Quando, por determinação superior, encobria os seios com os braços, descobria as partes inferiores; braços e mãos eram como um curto cobertor. Em respeito aos direitos humanos, os homens da ordem pública certamente aguardavam alguma policial ou uma equipe médica feminina, numa ambulância, para cobri-la com um lençol verde ou branco.
A mulher, muito observada, não se alterava, ora mirava o céu, ora, a Rui Carneiro, vendo coisas longe de si. Era simples, sem pintura, cabelos curtos, com cara de gente sofrida, de mãos vazias, contudo bronzeada, dos pés à cabeça, sem alguma marca na pele de roupa íntima, o que revelava sempre tomar banho de sol daquele jeito, como os nativos que ainda gozam a liberdade de viver como Deus os criou. O tráfego caminhou, algumas pessoas também. Já tão próximo, o carnaval nos convence de que, quando se usavam roupas, o nu era mais erotizado. Também que, enquanto a nudez se banaliza, o nudismo deixa de ser problema; e contradiz Nelson Rodrigues predizendo que “Toda nudez será castigada”.
Damião Ramos Cavalcanti